O consumo da carne de cachorro, segundo a família Lee

Lucas Lee é dono do restaurante Ogame, uma churrascaria sul-coreana localizada no Bom Retiro, bairro de São Paulo tradicionalmente recheado com a cultura do outro lado do mundo.

O Ogame é uma churrascaria que traz a tradição dos clientes prepararem suas próprias carnes, com cortes específicos, entregues e perfeitamente cortados. A ideia é muito vista nas séries sul-coreanas, mais conhecidas como doramas.

Lucas é filho de Hoo Sook Jo, que se mudou da Coreia do Sul para o Brasil quando ainda era muito jovem, por decisão de seus pais, que tentavam escapar das garras das guerras que se apresentavam como ameaça às suas vidas.

Sook Jo e sua família chegaram ao Brasil em 1966, quando ela tinha apenas 10 anos. Eles buscavam abrigo em um lugar que mantivesse sua segurança física e apresentava a possibilidade de encontrar maneiras de conseguir se reerguer financeiramente.

Sook Jo me conta que não teve grandes choques culturais ao chegar no Brasil, isso porque ela ainda era muito jovem e tudo era adaptável. No entanto, as raízes de quem somos é algo difícil de ser esquecido.

A mãe de Lucas cresceu em um ambiente assolado pelas guerras, terror econômico e fome na Coreia do Sul e, por isso, sabe exatamente como explicar sobre a história que levou o país a começar a consumir carne de cachorro em sua dieta diária.

“A história em relação ao consumo de carne de cachorro, é uma história desde a época de guerra da Coreia”, começa Sook Jo. “A Coreia era um país pobre e em estado de guerra, basicamente era consumido a carne de cachorro por falta de opção”.

No entanto, há uma certa cultura por trás desse consumo. A mãe de Lucas ressalta que os coreanos acreditavam que a carne de cachorro era uma proteína “fortificante”, ou seja, dava mais força para os trabalhadores e soldados que estavam lutando contra as invasões em seu país.

“Há relatos de que a carne de cachorro é uma carne muito proteica e tem substancias afrodisíacas. Então, relativamente era consumido também por soldados coreanos na época de guerra, e desde então, por um período, foi considerado um alimento fortificante. Principalmente para os homens”.

Outro ponto que é importante ao ser levantado, é que se acreditava que a carne de cachorro também afastava problemas sexuais na vida dos homens, principalmente nos meses mais quentes no país.

Sook Jo também me explica que o consumo está em declínio há décadas e, desde que ela se mudou da Coreia, a população já não era tão adepta a continuar comendo carne de cachorro em suas dietas diárias.

“Posso até dizer, para esclarecer, que esse consumo não foi passado de geração para geração. Na verdade, esse consumo foi proibido e deixado há muito tempo atrás”.

A proibição a qual a mãe de Lucas se refere não tem relação com a lei que está sendo movida no país. Na verdade, é algo que envolve a parte menos rural do país, que, nos anos 60, já tinha muito mais contato com o mundo e enfrentava as consequências da globalização.

Para Sook Jo, atualmente, a Coreia vive um momento em que esse consumo está cada dia menor e as novas gerações não consideram nem mesmo experimentar a proteína, que ainda era amplamente vendida em grandes mercados há pouco mais de 10 anos.

“Não posso confirmar que toda a Coreia não faça o consumo, pois sempre existirão pessoas antigas, com crenças antigas que talvez em algum lugar bem isolado, um local bem rural, talvez até faça”.

De fato, o consumo de carne de cachorro na Coreia do Sul ainda era elevado em áreas rurais, onde essa prática é considerada normal e faz parte da cultura, com grandes produtores dessa proteína que precisam lidar com as mudanças que a nova lei impõe.

Confira a história contada por Lucas Lee

Lucas Lee – Dono da churrascaria Ogame